Argamassa preparada e posta ao lado da pá, esperando o ladrilho para ser assentado no painel, e a mão empenhada em outros afazeres, nunca que chega ao ladrilho, este. O painel, paciente, espera. E aí, Beagá cai, de novo, na rede. Olha só o convite: o 1º Festival Literário Internacional de Belo Horizonte-FLI-BH acontecerá de 25 a 28 de junho.*
Vou pra lá conversar com as escritoras Dagmar Braga, Teresa Cárdenas e Clarisa Ruiz, também secretária de Cultura de Bogotá, sobre “Literatura e vias presentes”. E, aí, Dagmar prepara um rol de questões a pensar, que vão do nascimento da escritora, da relação com a leitura, passam pela produção do texto, alcançam a discussão dos suportes e da literatura contemporânea, seus temas, suportes, suas linguagens. Por onde vamos? – ela me pergunta, pedindo um eixo para o debate. O rol que propôs está mais que adequado, mas eu talvez opte por colocar em foco a viagem, as festas, feiras e os festivais, aproximando fisicamente leitor e escritor, escritores entre si. As trocas intensas outrora realizadas por cartas, textos em jornal, prefácios e confissões, hoje parecem acontecer em entrevistas e palestras. Como aconteceu em março último, em Bogotá, quando ouvi Adriana Lunardi, Aleyda Gutiérrez e Liliana Heker, e agora, que vou ouvir colegas novas.
Nem todas são novas, conheço Cárdenas** de pelo menos dois livros e alguns encontros, mas é de olho nessa troca, que efetuo há algum tempo com tantas e tantos colegas na América Latina em especial, que penso as vias presentes. Como se serve a literatura desses encontros? Em que fica diferente a produção literária quando leitores e escritores se encontram, se olham, se interrogam? Como pode cada uma de nós refletir sobre a própria produção tocada pelo encontro? E pelo encontro no clima de festa, de intenso consumo de literatura? De literatura ou de curiosidades acerca de escritoras, escritores?
Silviano Santiago e Roger Chartier já apontaram para o consumo contemporâneo não propriamente da obra do escritor, mas do projetado glamour de sua vida. O glamour que vibra no dom da palavra? Se quem recebe um dom, recebe também o trabalho correlato, então – ? O trabalho da palavra traz em si algo de invejável, a palavra feita fetiche pelo charme da caixa posta em mãos de Pandora?
Eu, de minha parte, tenho claro que ofereço o laboratório da escritora como lugar de trabalho, fábrica de ladrilhos, em que barro, água e fogo viram matéria de erguer, construir, abrigar, ocultar ou revelar. O resto, no obscuro. Para mim, a palavra chegando em dom passa necessariamente pela dívida e pela dúvida, antes de ser dádiva.
* https://www.facebook.com/FLIBH
www.belohorizonte.mg.gov.br/.../1o-festival-literario-internacional-de-b...
** Obras de Teresa Cárdenas publicadas no Brasil pela editora Pallas.