Poema de Manuel Alberto Valente. Curadoria de Heloisa Jahn
Setenta anos
Mãe, onde estás, que tenho medo
do quarto escuro e dos ciganos.
Eu sei que é o dia dos meus anos
mas tenho medo, tenho muito medo.
As mãos têm frieiras. Na quelha
a chuva é um rio. O vento assobia
nas janelas do sótão onde dormia
em casa dos avós uma criada velha.
É tarde e o pai ainda não veio.
Ladram os cães, e lá no meio
da noite sou eu que morro devagar.
Mãe, onde estás, que tenho medo
que a morte acorde manhã cedo
e seja eu que esteja a despertar.
Nasci numa casa rodeada
de comboios. Eu não sabia
que a...